Da Instituição de Pontes, por Cesar Kiraly

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Cesar Kiraly é professor de Teoria Política na Universidade Federal Fluminense.

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Resumo

Posto que o pensamento é uma imagem, o que nos faz buscar sempre imagens do pensamento, algo, talvez, que se pode denominar de uma imagem dialética, parece legítimo, pois, buscar a ligadura entre as imagens, entre as representações, entre os discursos, e se a ligadura entre idéias pode receber o nome de associação de idéias, o que nada mais é do que uma colcha de retalhos, talvez, e somente na hesitação, possamos chamar a ligadura entre imagens do pensamento de ponte. Ou talvez possamos usar uma marca gráfica.

Palavras-chave:

Hume, Spinoza, Hume-Spinoza

Abstract

Since thought is an image, what always makes us seek images of thought, something perhaps that could be called a dialectical image, seems legitimate, therefore, to seek the connection between the images,  between the representations, between the speeches, and conection between ideas can receive the name of association of ideas, which is nothing more than a patchwork quilt, perhaps, and only in hesitation, we can call the conection between thought images of bridge. Or perhaps we can use a graphic mark.

Key words

Hume, Spinoza, Hume-Spinoza

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Posto que o pensamento é uma imagem, o que nos faz buscar sempre imagens do pensamento, algo, talvez, que se pode denominar de uma imagem dialética, parece legítimo, pois, buscar a ligadura entre as imagens, entre as representações, entre os discursos, e se a ligadura entre idéias pode receber o nome de associação de idéias, o que nada mais é do que uma colcha de retalhos, talvez, e somente na hesitação, possamos chamar a ligadura entre imagens do pensamento de ponte. Ou talvez possamos usar uma marca gráfica. Como esta:

Assim, posto que entre imagens do pensamento, podem-se estabelecer pontes, algo como um acesso pictórico, julgamos lícito dizer que a confecção de uma ponte é uma enunciação criativa. Donde, entre Hume e Spinoza, deve-se construir uma ponte. Como esta:

Hume-Spinoza

Uma outra ponte foi construída entre Spinoza-Hegel num brilhante ensaio de Pierre Macherey, com sentido bastante diverso. Na ponte construída por Macherey a questão é mostrar os empecilhos do atravessamento, nas razões de uma fusão entre imagens. Na ponte de Macherey existe uma forte nova significação da obra de Spinoza como um invejável pensador do absoluto capaz de unificar elementos fragmentários numa forma: absoluto-fragmento. Nesta ponte, Hegel possui razões para temer, para temer a solidez, porque se Spinoza-Hegel não desmorona, podemos então ultrapassar o absoluto de Hegel, por um absoluto que pode tudo o que o absoluto pode, e mais além, ou mais um pouco, pode o fragmento-absoluto. Assim, a ponte construída por Macherey é perigosa se desmorona, ou se agüenta o peso, em todos os sentidos é uma ponte dos riscos do atravessamento[1].

Por certo, a ponte Hegel-Spinoza é distinta da Spinoza-Hegel, bem como, Hume-Spinoza é distinta da Spinoza-Hume. Spinoza-Hume é uma ponte possível, mas ilógica. O efeito de Hume-Spinoza é similar ao efeito Spinoza-Hegel, qual seja levar dimensão de fragmento, a uma península de absolutos. Uma ponte serve para levar senão pedaços. Esta percepção nos mostra que construir pontes entre filosofias não é a mesma coisa do que demonstrar, dentre elas, influências. As influências, inclusive, são pouco filosóficas, mas bastante históricas. Para se determinar uma influência é preciso realizar alguma sorte de trabalho detetivesco. É preciso mostrar alguma citação direta ou indireta, encontrar um livro anotado do influenciador na biblioteca do influenciado, estabelecer relações entre um professor influenciador de um influenciado com os argumentos do influenciado de segunda geração etc. Como em toda tentativa de demonstração de fidelidade ou infidelidade, a prova nunca chega. Ou seja, salvo quando não existe influência direta, por impossibilidade do tempo, da geografia, é simples estabelecer relações de influência, porque nelas toda prova é acidente: e pensar pela fidelidade ou infidelidade produz um pensamento de razões próprias. Mas isso não significa que, filosoficamente, a despeito de serem encontradas provas da influência não possamos construir pontes.

As pontes não são infinitas, elas não duram para sempre, e elas não são capazes de ligar por mera arbitrariedade. As pontes podem desafiar o sensível, mas não é capaz de tornar próximas duas pontas do impossível. E, por vezes, apenas o caminho de ida é possível, mas não o caminho de volta. Noutras vezes não se pode completar o caminho, pela necessária fragilidade com que a ponte é construída. Hume-Spinoza é uma ponte simples, na qual o caminho de ida e de volta é possível. Mas talvez seja uma ponte frágil demais, pouco generosa, sem condição de agüentar indecisos no meio do caminho. Trata-se, para os efeitos principais de nosso argumento, de uma travessia em direção à pictorialidade da experiência. Interessa-nos o percurso de ida, de Hume a Spinoza, e não o contrário, muito embora seja possível. Este percurso, Hume-Spinoza, zomba da concepção trivial de materialismo, que apenas concebe a relação entre pensamentos por vestígios abandonados. Zomba-se desta concepção trivial de vestígio. Se não formos triviais nas concepções de vestígio não apelaremos para a prova da relação, mas à pictorialidade da ligadura.

Hume-Spinoza ressalta, sobretudo, a geologia dos argumentos em forma de iceberg. No que eles consistem? Em modos da evidência da participação, de um problema central, de um solo conflitivo. Deus, Natureza, Homem, Razão, Consciência, Vontade, Desejo e Linguagem são pontas do iceberg de proporções continentais, e conflitivo, cujo corpo é organizado por modos, entendimento, artifícios, afetos etc. Hume, por outro lado, percebe o homem como a ponta do iceberg de um corpo monumental chamado natureza humana, cujas conflitivas podem ser descritas em termos de experiência, sensação e imaginação. Hume-Spinoza é o que nos importa, mas poderíamos determinar o argumento em forma de iceberg na filosofia da Vontade de Schopenhauer, na filosofia do desejo de Freud e na teorética dos jogos de linguagem de Wittgenstein[2]. Assim, a despeito dessa prova geológica, bastante relevante para se justificar o estabelecimento, ou a construção, de pontes, a efetiva prática construtiva deve evitar a substancialização de suas obras. Alguma plasticidade deve aos nomes ser acrescentada, para que não sirvam de índices da essencialização filosófica das obras, mas como índices de representações, imagens e crenças.

Para isso, interessa-nos menos os momentos de solenidade enunciativa, e mais os enunciados descontínuos. Onde eles serão encontrados? (1) Nas referências de Hume, nos Ensaios, a Maquiavel; (2) nas referências de Spinoza a Maquiavel no Tratado Político e (3) no verbete Spinoza do dicionário de Pierre Bayle, referência de Hume para conhecer Spinoza, posto que não leu a obra de Spinoza, e, por isso, valer-nos-emos das descontinuidades enunciativas de Hume sobre Spinoza.

A Presença de Maquiavel nos Ensaios de Hume

A presença direta de Maquiavel na concepção de política de Hume consiste num dos pontos de encontro que permitem Hume-Spinoza. Maquiavel é um espectro usado para a delimitação da política em Hume-Spinoza, bem como, é a linha do gosto político que precisa ser aprofundada e depurada. Ele, o florentino, é um ambiente imagético no qual Hume e Spinoza se encontram.

Não sem importância Maquiavel tem posição de destaque no ensaio de Hume Que a Política pode ser Reduzida numa Ciência. Para Hume, a possibilidade de uma ciência da política se deve a percepção de elementos políticos passíveis de serem explicados por princípios. Mas a ciência da política não é explicitada em virtude da descrição de comportamentos regulares, mas de certa capacidade do hábito humano em indicar os seus pontos de intensidade, ou seja, no índice acerca de quais eventos, ainda que não regulares, que podem mostrar uma significação. Assim, um princípio político não é obtido na narrativa da regra, mas na explosão cognitiva, e indutivista, mostrada por Maquiavel. A política é um quando instituinte para a regularidade, mas a ciência da política é epistemologicamente orientada para os hábitos intensivos, essa percepção que faz da experiência elemento expressivo, porque indutivo. A ciência da política, para Hume, possui uma tabula rasa, mas ao invés de um plano branco, possui o plano intensivo das narrativas maquiavelianas. Maquiavel é a tabula rasa da ciência da política humeana.

A ciência da política é Maquiavel mais a possibilidade epistemológica de princípios. Para Hume, Maquiavel mistura o verdadeiro com o falso, mas apenas de suas narrativas podem ser retiradas verdades políticas.

Pode parecer estranho, diz o político [Maquiavel], que conquistas tão repentinas como as de Alexandre possam ter sido conservadas de forma tão tranqüila por seus sucessores, e que os Persas, ao longo de todas as confusões e guerras civis que se verificaram entre os gregos, nunca tenham feito o menor esforço para recuperar seu antigo governo independente[3].

Porque a verdade da moderação em política não pode ser arranhada. Os governos administrados sob a perspectiva da concentração de poder é difícil de ser conquistado, pois é complicado encontrar alguma vaidade que possa ser usada como cavalo de tróia, mas uma vez conquistado, pelas mesmas razões, é simples de ser mantido.

Nos governos em que se distribui o poder a discórdia migra das armas para o discurso, logo, é simples conquistá-lo e fácil perdê-lo. Deve ser dito, de toda a diaphonia indutiva de Maquiavel, um hábito intensivo pode ser percebido: o poder se protege no segredo. Nos governos moderados as nomeações, as honrarias, o enriquecimento, a discursividade pública, tornam o poder de tal maneira espraiado que é praticamente impossível deter o segredo da política. A república é mais poderosa do que a tirania, porque é infinitamente mais opaca. O segredo da tirania é um enunciado escondido na vontade do tirano. Contudo, o segredo da república é um enunciado escondido e ponto. Uma verdade pode ser retirada: por mais que a política tenha que ver com o poder, ela não se confunde com a soberania, detentora do segredo.

A política institui significados no tempo, para a consecução da regularidade, e a soberania destaca significados do tempo para fazê-los segredo. Assim, podemos dizer que quão mais intenso for o medo mais forte será a soberania, mas isso não significa uma força de discurso, porque uma vez derrubado o medo, ou o segredo, aquele que sucede no poder contará com a mesma pacificação dos discursos. Por isso, a soberania e a exceção são mais próximas do direito do que da política, que sempre visa o estabelecimento de regras de inscrições instituídas[4].

A verdade que Hume retira de Maquiavel é que a política é sempre mais forte do que a soberania. A dissipação do poder pela política protege o direito e a soberania, mas o direito e a soberania não conseguem exercer proteção reversa[5]; a política está sempre só. Por isso, “Maquiavel diz que muitas vezes os governos se vêem forçados a voltar a seus princípios originais[6]”. As soberanias moderadas são mais plásticas, então, suportam a dominação e a ela reage, essa característica advém do fato da soberania estar diretamente ligada aos seus componentes políticos, ou seja, às dimensões instituintes à regularidade.

Até mesmo a exceção soberana acaba por ter elementos da política. Se levarmos tal raciocínio para a função soberana do segredo, perceberemos que Hume defende certa apropriação discursiva do segredo capaz de, pelo medo, fundar a soberania. Por certo, as fundações da soberania, pela politização, tornam-se mais fracas, se entendermos resistência por força, e tornam-se mais fortes, se entendermos a plasticidade da resistência constante uma força.

A Presença de Maquiavel no Tratado Político de Spinoza

O espectro de Maquiavel não nos leva a crer pela separação entre a política e a soberania, não existe esta relação entre o dentro da soberania e o preenchimento da política, mas existe alguma força de tração que coloca a vida pública entre o medo soberano e o dissenso político. A distinção quando ocorre não se deve a essência de tais fenômenos, mas aos modos enunciativos aos quais se vinculam. Nessa perspectiva, a soberania é distinta da política, porque o jogo do pensamento soberano diz respeito a enunciados que tematizam a abstração do medo, pela idéia de indivisibilidade do poder, de modo a estabelecer a sensação do fundamento.  A política, ainda nessa perspectiva, participa de jogos enunciativos relacionados ao desejo, por isso, podemos relacionar a sua autenticidade ao dissenso, mesmo ainda quando existe a formação de grupos. A política encontra sua inautenticidade na regularidade, mas seus gestos enunciativos são autênticos justamente ao permitirem a regra. A autenticidade soberana é uma quase exceção. Pois bem, a soberania e a sua captura com o direito, com a ordem e com a exceção apenas por ilusão afasta política de sua composição e o espectro de Maquiavel leva a entender que a soberania é mais forte quão mais dissensual.

O penetrante Maquiavel demonstrou clarissimamente que meios um príncipe onipotente, possuído pelo desejo de domínio, deve usar e manter o seu poder; porém, quanto ao fim visado, este não surge claramente. Se se propôs uma boa finalidade, tal como é de esperar de um homem prudente, parece demonstrar de que imprudência as massas dão provas quando suprimem um tirano, quando não podem suprimir as causas que fazem com que um príncipe se torne tirano, mas, pelo contrário, quanto mais motivos houver para temer um príncipe, tanto mais causas há para dele um tirano, tal como acontece quando a multidão faz do príncipe um exemplo e glorifica um atentado contra o soberano com um alto feito[7].

O ataque ao soberano não desmonta a soberania, porque essa é apenas a condição social do medo passível de ser exercido pelo soberano. Ele exerce certa disponibilidade do medo, e ela é franqueada a quem puder capturá-lo. Assim, para se politizar a soberania não é necessário atacar o soberano, mas aos sistemas de medo. A confusão entre soberania e soberano apenas aprofunda os mecanismos do temor. Não existe política sem medo. Não existe política sem que algum elemento soberano esteja presente. Mas, noutra esfera, podemos imaginar uma soberania na qual os modos do medo são tão expressivos que fazem com que se duvide da própria existência da política. Assim, a política faz da soberania algo plástico e forte, mas a política é sempre mais fraca do que a soberania. À soberania basta a existência do medo. À política é necessária a imaginação, a instituição e os mecanismos para se pensar o futuro.

Talvez Maquiavel tenha querido, também, mostrar quanto a população se deve defender de entregar o seu bem-estar a um único homem que, se não é fútil ao ponto de se julgar capaz de agradar a todos, deverá constantemente recear qualquer conspiração e, por isso, vê-se obrigado a preocupar-se, sobretudo consigo próprio e, assim, a enganar a população em vez de salvaguardá-la. E estou tanto mais disposto a julgar assim acerca deste habilíssimo autor quanto mais se concorda em considerá-lo um partidário constante da liberdade e quanto, sobre a maneira necessária de conservá-la, ele deu opiniões muito salutares[8].

Porque a soberania pode estar concentrada em um homem ou em uma idéia. A política, por outro lado, está sempre imersa num plano cromático de dissenso bastante impressionista. Spinoza percebe no espectro de Maquiavel certa operação do espírito que manda relativizar a abstração soberana pelo conteúdo do que chama de liberdade. Se a preocupação de Hume ao buscar o espectro de Maquiavel é mostrar, no plano impressionista, a presença dos princípios pelos quais a política mostra o seu rosto – donde se pode perceber a possibilidade de se conquistar espíritos moderados, daí a enorme potência da moderação –, a questão de Spinoza é a evidência de que a função soberana do medo existe para aqueles que têm medo.

Não se trata, em Spinoza, de um princípio, mas da descrição de certa operação social. A soberania autoriza formas de servidão voluntária, desde que a servidão crie o soberano. Aqui, não sem humor, o dogmático e o cético, nos espectros maquiavelianos, brincam de perspectivismo. Spinoza, o dogmático, mostra que a política é uma experiência e Hume, o cético, que a política é um princípio sobre a experiência. Como compreender a irônica mudança de lados? (Nesse labirinto chamado Maquiavel). Spinoza, ateu de sistema, percebe que a política demanda certa agudeza de olhar, possível por causa da experiência maquiaveliana. Hume, um cético de sistema, percebe que a política pela sua natureza de instituição, por ardil, institui a si mesma, por princípios. Spinoza e Hume, por percursos diferentes, convergem por motivos maquiavelianos: para se ver a crueldade nos matizes soberanos é preciso outra forma, passível de ser chamada de crudelis meditatio. Nela a experiência da cotidianidade e a percepção de princípios realizam o quadro da natureza humana nos matizes da soberania.

Na crudelis meditatio o cético e o dogmático se encontram para pensar como Maquiavel. Acontece que se a soberania procura no medo o seu fundamento, a política encontra na crença a sua fundação. Esta crença pode ser chamada de um princípio, mas apenas para reforçar a estabilidade da crença política, e não para minorar o caráter fictivo, deve ser chamada de princípio esta atividade de instituir no espaço uma crença, cujos efeitos rivalizarão com o medo. Se por um lado o pensamento soberano foge da instituição, muito embora não possa ignorá-la, por outro, sem determinados sistemas de crenças não há que se falar em pensamento soberano.

Por isso, Spinoza indica, seguindo Maquiavel, se o medo nas instituições é extremado, deve-se, no caso de fundações moderadas, recuperar os princípios sobre os quais se sustentam. O ponto é que as crenças pelo modo soberano podem sofrer de uma espécie de patologia pública: a servidão como patologia política. Ou, ainda, a servidão como taraché.

A primeira causa possível de dissolução é a que observa o agudíssimo florentino (Maquiavel) no seu primeiro discurso sobre o terceiro livro de Tito Lívio: num Estado, como no corpo humano, há certos elementos que se ligam aos outros e cuja presença requer, de quando em quando um tratamento clínico; é, portanto, necessário, diz ele, que por vezes uma intervenção recupere o Estado para os princípios sobre os quais está fundado. […] Esta intervenção, acrescenta ele, pode acontecer por acaso ou devido a uma legislatura prudente, ou, enfim, à virtude de um homem de uma virtude excepcional. E não é duvidoso que isto deixe de ser circunstância de maior peso e, se não for dado remédio ao mal, o Estado já não se poderá manter por virtude própria, mas unicamente por feliz fortuna. Pelo contrário, se o conveniente remédio é aplicado a queda do Estado não poderá resultar de um vício interior, mas de um destino inelutável […][9].

Cabe saber, todavia, se o combate a esta forma de patologia política chamada servidão (o modo de obtenção de ataraxia) deve ser empreendido de modo literal ou metafórico. Compreender de maneira metafórica é mais simples: “o Estado como se fosse um corpo”, “a servidão como se fosse uma patologia” e “a liberdade como se fosse um remédio”. A metáfora, aqui, aplaca os efeitos do enigma. E, parece-nos, a imaginação, nesse caso, pode muito mais do que a metáfora. Se concedermos alguma literalidade deveremos perceber o remédio de maneira discursiva, então, não estaremos diante tanto de uma mui bastante substância do que de uma terapia. Parece-nos bastante cético Hume-Spinoza, porque esse modo de terapia concerne ou a suspensão dos discursos, o que não é o caso, ou a imersão na pictorialidade dos discursos. Essa terapia cética presente em Spinoza concerne a certo retorno aos princípios, de modo anacrônico, podemos entender que são aqueles de que nos fala Hume. E se for o caso, essa terapia exerce alguma sorte de veneno à soberania. Esta terapêutica envenena o pensamento soberano com as dissonâncias da política. Nesta terapêutica a soberania é chamada a sair de si, a sair de sua província abstrata de medo, e instituir a si mesmo como crença: como significação no tempo.

Não será pela metáfora que a instituição política se imporá, não o fará como metáfora das transformações químicas em um organismo social, mas pelas virtudes da imagem[10]. Alguma coisa nos leva a crer que a imagem Hume-Spinoza, cujo encontro se dá no espectro Maquiavel – a espectralidade é uma imagem esmaecida – e se há uma imagem maquiaveliana por definição, pois bem, é a de certa figurabilidade da natureza humana e do rosto humano[11]. Essa “alguma coisa” que nos faz crer em imagens é a política – e a terapia cética presente em Hume-Spinoza faz da imagem o fortalecimento da política frente a soberania.

A Imagem de Spinoza no Dicionário de Bayle

Este é o penúltimo acréscimo a esta imagem do pensamento denominada Hume-Spinoza. Hume percebe certa imagem spinozista no dicionário de Bayle. Pelo que consta, Hume nunca leu Spinoza, mas fala sobre, e o reconhece, pelas impressões da exposição de Bayle. E dizemos impressões no sentido em que o escocês o faz no primeiro livro do Treatise: uma imagem bastante intensa, inscritora e inegociável. Assim, resta-nos pelo que há de inegociável em Bayle à imagem Hume-Spinoza. Antes de tudo, parece inegociável o fato de que o ceticismo tem no seu estilo um componente do dizer, não somente no que concerne ao filosofar por novos gêneros literários, mas o fato de que compõe o ceticismo a inovação quanto as formas estéticas da enunciação. Como se a forma filosófica do ceticismo além de intencionar um dizer também dissesse respeito a um mostrar. Assim, há de inegociável em Bayle o seu modo de escritura em caligrama: espaços curtos de exposição, ou longos, e variáveis, notas que se espalham pelas bordas, tendo como padrão apenas a localização na borda, notas que se proliferam abaixo do texto, e que num tempo oprimem, por outro aliviam e por hora mudam o significado; e uma estética impressionista da página, dependendo do verbete, a mostrar o dizer[12].

figura 1

No verbete Spinoza o caligrama fica ainda mais explícito, porque a questão de Bayle é mostrar como o ateísmo permite uma outra forma de cosmologia, ou princípio de ordem, aquele presente no sistema. Pode ser que a vontade de sistema, em Spinoza, seja uma forma de fazer com que exista alguma forma de fragmentação dos modos da imanência. Contudo, Hume resiste a ver a substância como uma imagem, com certa plasticidade, o que nos leva a termos nele um opositor cético à imagem Hume-Spinoza. Nas resistências de Hume a Spinoza, uma imagem que depende de Bayle, existe uma forte recusa à idéia de substância: como se o mero emprego da palavra substância significasse o compromisso filosófico com a vedação à plasticidade e o estreitamento com o unitarismo. A imagem que Hume tem de Spinoza não o permite ver o conteúdo imagético da substância – mas a imagem estava lá em Bayle. Parece que Hume, ao ler Bayle, resiste a ver Spinoza pela perspectiva do caligrama.

figura 2

O princípio fundamental do ateísmo de Spinoza é a doutrina da simplicidade do universo, e a unicidade de sua substância, na qual ele supôs inerentes o pensamento e os modos. Há somente uma substância, ele diz, no mundo; e essa substância é perfeitamente simples e indivisível, e existe em todo canto, sem uma presença local. Seja o que conhecemos externamente pelas sensações; seja o que sintamos internamente pela reflexão; todas essas [manifestações] não são mais do que modificações desse único, simples, e necessário ser existente e não são passíveis de nenhuma separação ou existência distinta. Cada paixão da alma; cada configuração dos modos, ainda diferentes ou variadas, é inerente a uma mesma substância e preservam seus caracteres de distinção, sem se comunicar com esse sujeito, com relação ao qual é inerente. O mesmo substratum, se assim posso dizer, suporta as mais variadas modificações, sem qualquer diferença em si mesmo; e podem variar, sem qualquer variação. Nem tempo ou lugar, nem toda diversidade da natureza é capaz de produzir qualquer composição ou mudança nessa perfeita simplicidade e identidade[13].

A distinção maior entre Hume e Spinoza, o que insere sempre uma dissonância em Hume-Spinoza, não se dá na questão do dogmatismo, no que Spinoza atribuiria invisibilidade ao visível, mas na percepção da existência. Nem mesmo a causalidade produz tamanha distância, porque é nítida a diferença entre a causalidade de Hume e a de Spinoza. Para Hume não há que se falar de causalidade intrínseca à experiência e para Spinoza a causalidade é por demais nobre para ser humana. Assim o problema se resolve, e a causalidade não inviabiliza a nossa ponte. Mas na existência o problema é mais profundo. Para Spinoza, existir significa persistir na existência, ou seja, o conatus é um princípio que altera o modo dos corpos e das idéias. Para Hume, existir não é um problema. Aquilo que se denomina existir não marca a diferença entre idéias, e por isso existir não acrescenta algo de essencial à experiência. O que distingue uma idéia da outra é a crença. Spinoza, por sua metafísica, é um realista, com intenso otimismo epistemológico. Hume, por seu empirismo, é um irrealista repleto de pessimismo epistemológico.

Em Hume-Spinoza existe realismo e irrealismo. Assim, percebe-se, como em Hume, a necessidade de instituição de mundos e Spinoza mostra que esses mundos, uma vez instituídos, realizam constituições acerca de seus direitos. O pessimismo de Hume abriga, todavia, um otimismo estético com relação a necessidade de atualização constante das instituições, de novas significações no tempo, ao que Spinoza, sempre otimista, retorquiria pela necessidade de constituição, daí o spinozismo ser uma atitude de pessimismo estético. Cabe em Hume-Spinoza bem orientarmos os pessimismos e os otimismos de maneira a conjugarmos a estética instituinte e a constituição de tradições. Não sem gosto, nos caligramas de Bayle, ao tratar de Spinoza, as aspas aparecem como em cascata por debaixo do texto. E Bayle não se cansa de dizer que o TTP é uma obra detestável, mas nos cabe a pergunta se não é uma obra detestável, porque mostra o detestável. Maquiavel é detestável, Spinoza é detestável e Hume é detestável: estaríamos, pois, diante de uma linhagem detestável da filosofia política, dentre outras razões, porque na crudelis meditativa a reflexão é o pensar o detestável.

Para Bayle, Spinoza é um ateu de sistema. Deve-se perceber que um ateu de sistema é diferente de um ateu sistemático (como nos traduz a edição de Popkin). A primeira maneira de ver, vê-lo como ateu de sistema abre a filosofia de Spinoza à ponte entre filosofias e a segunda retira a possibilidade da ponte. A primeira maneira de ver ressalta que Spinoza vive entre dois abismos, aquele do ateísmo e aquele do sistema. Mostra que Spinoza não está em lugar nenhum, mas apenas na ligadura. A primeira maneira de ver faz de Spinoza um espectro triste, demonstrável no atrelamento do tipográfico, o modo de compreendê-lo, e que se realiza em encontros felizes, como esse possível com Hume. A tradução de Popkin demole o nosso argumento, porque nela Spinoza já tem tudo: um ateísmo sistemático[14]. Nada mais estranho do que pensar Spinoza em contexto de satisfação, parece que Bayle está certo, entende-se Spinoza nas circunstâncias em que não se tem nada: “Entretanto, de pouco a pouco ele se tornou um estranho em sua sinagoga, e ele teria mantido contato por mais tempo se não tivesse sido atacado por um patrício com uma faca. Spinoza cria que a intenção fosse assassiná-lo. Depois desse evento se afastou da comunidade, o que foi a causa de sua expulsão[15]”.

O malicioso Bayle tenta nos induzir a julgar a atitude filosófica de Spinoza pelos efeitos do medo. Ao que Bayle vincula o TTP, ele qualifica o TTP como um livro escrito por medo. Uma resposta ao seu afastamento da comunidade judaica, ou seja, um Tractatus cujo espírito seria o medo. Ainda que o medo seja um objeto das reflexões políticas de Spinoza, a servidão tem que ver com o medo, o Tractatus é sobretudo uma defesa da possibilidade da imagem, do público, da possibilidade tipográfica. Pierre Bayle e Spinoza possuem muito em comum: vinculam o pensamento à tipografia. À maneira não-historicista do ceticismo diríamos que Spinoza, como Bayle, vincula o pensamento à imagem. Por essa razão faz sentido dizer que a quarta meditação toca Spinoza – e talvez Bayle, mas com certeza Hume – de um modo vedado ao próprio Descartes. Não é só a consciência que é uma imagem, mas também a experiência. A marca tipográfica é também uma imagem da experiência-imagem. A defesa do tempo tipográfico, o qual se assemelha ao tempo do polimento, por Spinoza, é tão intensa que o leva a recusar a cadeira de filosofia de Heidelberg, oferecida por Leibniz, uma recusa a vocalização dos enunciados, onde os espectro se constrangem, posição a que o não-tipográfico Hegel, lembrando a recusa de Spinoza, tempos depois, se felicita por assumir.

O Espectro Maquiaveliano em Bayle

Não há como objetar que Maquiavel, para o pensamento político, não passa de um espectro aforístico contemporâneo e iniciador da grande esperança na capacidade inscritora do pensamento, bem como, do forte ceticismo axiológico sobre a capacidade inscritora da filosofia política; e se ele se mantém como espectro, e Maquiavel é um nome-instituição, uma máquina de animismo, esta é a sua grande virtude. Se existisse uma taberna onde Hume e Spinoza pudessem se encontrar, este pensador ambiente, esta máquina de ser e estar, só poderia ser a espectralidade do florentino. A tipografia holandesa de Bayle é responsável, em seis páginas, em parte, pela criação deste espectro. Porque o projeto bayleano de conferir imagem à diaphonia da filosofia – o que infinitamente distinto do recenseamento de escolas de pensamento feito por Aristóteles e Tomás – deu corpo e espírito a fantásticas quimeras filosóficas. Os monstros de Bayle são predicadores do assombro (pelo menos na imaginativa cabeça de Hume). No caso de Maquiavel, Bayle deu existência ao pensador cruel e virtuoso.

A obra de Maquiavel, tal como apresentada no verbete do dicionário de Bayle, não é uma espectralidade coringa. Ela não produz efeito de ambientação para qualquer jogo enunciativo. A espectralidade é antes circulada por representações frustradas, mas o efeito de ambientação é estabelecido apenas para filosofias orientadas pela crudelis meditatio. Os enunciados frustrados são aqueles que afirmam que Maquiavel é um educador de tiranos e aqueles que dizem que o florentino é um republicano. “Átomos Tito-Lívio” ou “átomos príncipe” acabam por montar trajetórias acerca das fronteiras do espectro maquiaveliano.

Este conjunto de enunciações equívocas se organizam nos sistemas de representação estabelecendo a província para o pensamento político da crueldade: (1) o equívoco da enunciação de Maquiavel como mero dramaturgo copista (nota A da página 3: 244 da edição fac-símile). (2) o equívoco da enunciação de Maquiavel como blasfemador (página 3: 245 da edição fac-símile). Quando na verdade sua obra aponta para o efeito encobridor da religião sobre a crueldade da política (ainda que se ocupe em mostrar a crueldade não mostra, como Hume-Spinoza, o que se deve fazer para contê-la). (3) A enunciação equívoca de que Maquiavel por tratar dos assuntos da crueldade política, sob tirania ou república, não seria um pensador de gabinete: a crueldade é percebida apenas no gabinete: no gabinete são empreendidos os esforços de desencobrimento (nota E da página 3: 245 da edição fac-símile). (4) A enunciação equívoca de que a guerra se confunde com a política, como se o conhecimento da arte da guerra permitisse conhecer algo sobre a política. Quando na verdade a guerra é um elemento encobridor da política, de sua crueldade, tal como a religião e a moral abstrata. A política é encoberta pelo polemós: e por isso nele se refugiam as pretensões transcendentes da religião[16].

A espectralidade de Maquiavel, e por isso a primeira paternidade da política nunca poderá lhe ser negada, está na homologia de seu nome com a própria experiência da política. Existe um conceito “Maquiavel” que se estabelece por encobrimento e crueldade tal como a experiência da política. Não se pode esquecer que ele é levado à república por ser um dramaturgo cômico. O florentino é levado para acompanhar a república. Tal como é levado debaixo do braço de Catherine de Medicis e seus filhos[17]. E, por tanto, é relevante falar dele, bendizê-lo ou maldizê-lo, mas dizê-lo como demonstrador da política com ou contra o tirano. Bayle, com sua tipografia holandesa, é um fazedor de espectros encobertos por notas de rodapé, neste caso o encobrimento bayleano se compõe com o conceito que explicita: o encobrimento da política em todas as suas dimensões a reagir a crueldade. O dramaturgo é aquele que acompanha a dramaturgia encobridora à política. Pois bem, o conceito Maquiavel “viveu na miséria, fez graça e não manteve religião[18]”.

BIBLIOGRAFIA

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Maquiavel, Nicolau. Discursos Sobre a Primeira Década De Tito Lívio. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1979.

———. O Príncipe. São Paulo: Hedra, 2007.

Spinoza, Baruch. Tratado Político. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

———. Tratado Teológico-Político. São Paulo: Martins Fontes, 2005.


[1] Pierre Macherey, Hegel Ou Spinoza (Paris: La Découverte, 2003).

[2] Pode ser que Wittgenstein seja uma filosofia em forma de iceberg, ou, talvez, a última filosofia com essa forma de argumento, talvez ele seja uma modalidade de aquecimento capaz de extinguir essa forma filosófica. Algo como o derretimento de certa imagem do pensamento.

[3] David Hume, “Que a Política Pode Ser Reduzida Numa Ciência,” in Ensaios Morais, Políticos E Literários (Rio de Janeiro: TopBooks, 2004). p.115-117

[4] Um dos equívocos na interpretação da exceção, ou de seu estado, é julgar que ela encontre abrigo que seja propriamente político: toda exceção é exceção jurídica. Não existe uma exceção à política, mas pode existir, nos modos pelos quais o direito lida com a política, uma exceção ao direito político. Na verdade é um rendimento da política ao direito que permite o tipo mais escabroso de exceção. Giorgio Agamben, State of Exception (Chicago: University Of Chicago Press, 2005).

[5] Hume, “Que a Política Pode Ser Reduzida Numa Ciência.” p.119 e Nicolau Maquiavel, O Príncipe (São Paulo: Hedra, 2007). Capítulo 4.

[6] David Hume, “Idéia De Uma República Perfeita,” in Ensaios Morais, Políticos E Literários (Rio de Janeiro: TopBooks, 2004). p.725 e Nicolau Maquiavel, Discursos Sobre a Primeira Década De Tito Lívio (Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1979). Livro 3, capítulo I.

[7] Baruch Spinoza, Tratado Político (São Paulo: Abril Cultural, 1983). §7. Capítulo V. p.321

[8] Spinoza, Tratado Político. §7. Capítulo V. p.321

[9] ———, Tratado Político. §1. Capítulo X. p.359

[10] Baruch Spinoza, Tratado Teológico-Político (São Paulo: Martins Fontes, 2005). Capítulo V. p.86 “A natureza humana, porém, não tolera ser totalmente coagida e, como diz Sêneca, o Trágico, nunca um poder violento se agüentou por muito tempo; um poder moderado, pelo contrário, é duradouro. Na verdade, quando os homens agem apenas por medo, fazem o que menos gostariam de fazer e não se importam com a utilidade nem com a necessidade do que fazem, procurando unicamente não pôr a cabeça em risco, isto é, não se expor aos castigos”.

[11] Spinoza, Tratado Teológico-Político. Capítulo XVIII. p.284-285 “É evidente que, se quer mesmo ser rei e não reconhecer o povo como seu juiz e senhor, e não quer reinar provisoriamente, tem de vingar a morte de seu antecessor e contrapor assim um novo exemplo, de modo que o povo não ouse repetir tal façanha. Mas ser-lhe-á muito difícil vingar a morte do tirano pelo assassínio de cidadãos, se ao mesmo tempo não fizer sua a causa daquele a quem sucede, não aprovar os seus atos e não seguir, por conseguinte, todas as suas pisadas. Daí o povo mudar tantas vezes de tirano sem nunca abolir a tirania”.

[12] O caligrama é uma invenção estética de Apollinaire concernente à poesia: uma escrita-imagem. Pela inovação da estética tipográfica, bastante influenciada pela escola de tipografia holandesa, podemos dizer que Bayle faz um modo caligramático de pensamento ao fundir o dizer e o mostrar, principalmente no que concerne aos verbetes Spinoza e Maquiavel.

[13] David Hume, Tratado Da Natureza Humana (São Paulo: Editora UNESP, 2001). Seção V. Livro 1.

[14] Pierre Bayle, Historical and Critical Dictionary: Selections, trans. Richard H. Popkin (Indiana: Hackett Pub Co, 1991). p.292 Spinoza é um ateu de sistema com um método próprio. Pelo medo através do qual Bayle vê Spinoza, e seu sistema, nele o sistema faz do mundo uma única substância chamada Deus: de modo a não existir distinção entre Deus e a matéria primeira. Para Bayle não há distinção entre o spinozismo e o atomismo, porque se há acaso ele é necessário. “O dogma da alma do mundo, que é comum aos antigos, e que foi parte principal do sistema estóico, é no fundo o dogma de Spinoza”. ———, Dictionaire Historique Et Critique (Amsterdam: fac-similé, 1740). 4: 253 Contudo, o spinozismo é anti-retórico, o que torna a geometria do mundo não uma prática de conhecimento, mas um estado ético. Este estado ético não poderia ser sustentado sem essa cosmologia de homologia alma-Deus-mundo. Ao que Hume contraporia o conceito de moral: esta forma de pensar a vida numa experiência sem cosmológica.

[15] Bayle, Historical and Critical Dictionary: Selections. p.293

[16] ———, Dictionaire Historique Et Critique. 3: 247

[17] ———, Dictionaire Historique Et Critique. 3: 248

[18] ———, Dictionaire Historique Et Critique. 3. 245